Novo presidente do Conselho Nacional da Juventude, Alessandro Melchior, atua no movimento LGBT desde 2008
Por Marcelo Hailer
Há duas semanas, o Conselho Nacional da Juventude (Conjuve) elegeu o
seu novo presidente, Alessandro Melchior, 26. Melchior iniciou a sua
trajetória política no movimento estudantil secundarista, na UMES- São
José do Rio Preto. Posteriormente atuou como gestor municipal e teve os
primeiros contatos com a agenda política internacional da juventude,
através da Unidade Temática de Juventude da Rede de Mercocidades, que
reúne prefeituras de diversas cidades do Mercosul.
Em 2008, Alessandro Melchior iniciaria a sua atuação no movimento
LGBT e, já em 2009 assumiria a Coordenação da Juventude da ABGLT
(Associação Brasileira de Lésbicas, Gays, Bissexuais, Transexuais e
Travestis), representando esta instituição desde 2010 no Conjuve. Em seu
primeiro mandato foi representante na Reunião Especializada de
Juventude do Mercosul, no segundo mandato integrou a Coordenação da
Comissão de Acompanhamento de Políticas e Programas.
Na entrevista que você lê a seguir, Alessandro Melchior se diz
contrário à política de internação compulsória aos usuários de drogas, a
qual ele classifica como “higienista”. O novo presidente do Conjuve
também é categórico ao afirmar que hoje os “jovens são a grande maioria
das vítimas dos casos de homofobia no Brasil” e que vivemos, atualmente,
um “verdadeiro genocídio da juventude negra e da periferia”.
A partir de sua experiência com a militância política, qual a demanda que você considera mais urgente à juventude?
Precisamos parar, imediatamente, de exterminar os nossos jovens.
Temos um verdadeiro genocídio da juventude negra e da periferia, com
responsabilidade social e estatal, não apenas pela omissão, mas também
pela ação. Nossos índices, em diversos casos, são próximos aos
apresentados por países em estado de guerra. Darcy Ribeiro dizia em um
de seus textos que o Brasil sempre foi, e ainda é, um moinho de gastar
gentes. Se ele vivesse hoje, diria que o Brasil é um moinho de gastar
jovens.
Em seu ponto de vista, o que difere a eleição de um presidente oriundo do movimento LGBT ao Conjuve?
Isso, entre outras coisas, exemplifica a capacidade de diálogo com os
outros movimentos sociais que o movimento LGBT adquiriu no período
recente. Não apenas com os movimentos sociais, mas nossa eleição também
foi fruto de um diálogo sincero com os vários ministérios e outras
organizações da sociedade civil. Obviamente, também foi uma resposta à
sociedade e à institucionalidade, considerando o momento que vivemos no
Brasil.
Desde 2010 o Brasil vive um cenário de forte embate político
entre setores fundamentalistas e progressistas. Acredita que os
discursos de ódio proferidos pelos parlamentares e pastores atingem de
maneira mais forte os jovens? Visto que muito deles nem do armário
saíram ainda.
Não só no âmbito da homofobia. Esses discursos de ódio têm atingido a
juventude de forma geral. Eles têm incentivado a perseguição às
culturas indígenas, queimando templos religiosos no centro-oeste,
impedido os avanços para garantia de mais direitos às jovens mulheres,
apoiado a política de drogas falida que temos hoje e agora fortalecem a
ideia de criminalização da juventude, por meio da defesa da redução da
maioridade penal. E, infelizmente, eu vejo que nós, os progressistas,
estamos perdendo terreno na luta institucional. Tem muita gente que veio
da banda de cá, que está tocando do outro lado, sendo cooptado e
defendendo o que esse ‘Eixo do Mal’ representa. Estou falando de parte
do núcleo duro do governo federal e da timidez, pra não dizer outra
coisa, das bancadas mais progressistas do Congresso.
Como você colocaria a pauta LGBT no âmbito da juventude?
A situação de violência em que vive a juventude LGBT é comum a de
outros setores. Mas a resposta não. Então, em primeiro lugar, é preciso
avançar no sentido de confrontar essa realidade. Relatório do Governo
Federal, da Secretaria de Direitos Humanos, revela o que o movimento
LGBT vem dizendo há muito tempo, os jovens são a grande maioria das
vítimas dos casos de homofobia no Brasil. Por isso é preciso cobrar
atitude do Governo Federal, dos Estados e Municípios. Nessa mesma linha
precisamos incidir mais no Legislativo e temos disposição para isso no
Conselho. Em relação à juventude, especificamente, é importante que os
jovens atentem que, os mesmos que atacam hoje a liberdade sexual e a
cidadania LGBT, são os que defendem restrição de liberdades em geral,
menos participação política e menos direitos para o povo brasileiro.
Essa galera está unida do lado de lá.
Ultimamente as políticas de internação compulsória para
cidadãos usuários de drogas têm sido adotadas por alguns governos. Qual é
a tua posição sobre este tema?
Essa é uma das expressões de um movimento mais amplo contra as
liberdades democráticas. Eu sou contra esse absurdo neofascista. Você
não interna ninguém compulsoriamente. A história tem mostrado,
inclusive, que quando isso surge, é para limpar a sociedade, numa lógica
higienista em que entram pobres, negros, prostitutas, homossexuais,
travestis, usuários de drogas e outros. Além do que, quem defende isso
aí não quer saber de fortalecer os CAPS AD, os equipamentos e a política
pública de saúde, quer é jogar dinheiro público para ser lavado nas
comunidades terapêuticas do fundamentalismo religioso.
Você é a favor da liberação e descriminalização das drogas? Fale sobre isso.
Sim. Sou favorável. Assim como a sensatez e
o bom senso também são. A Organização dos Estados Americanos se
posicionou recentemente sobre a necessidade de uma nova política de
drogas e vai realizar um seminário em junho para debater o tema. O
Governo dos Estados Unidos começou a reconhecer a falência da política
atual. Por quê? Porque ela não funciona, porque ela, com a
criminalização da venda, cria uma reserva de mercado ao crime
organizado, que sustenta o sistema financeiro internacional e financia a
política pelo mundo afora. Em 2008, quando estourou a crise financeira
que ainda assola o mundo, quase US$ 400 bilhões de dólares foram lavados
pelo sistema bancário, o que representou 1/3 das perdas com a crise.
Alguém realmente acredita que a maconha causa mais danos à vida da
juventude que o álcool? Vamos pegar os dados de mortes no trânsito,
violência causada pelo consumo de álcool. Acredito que ainda teremos
maturidade para debater esse tema com o nível de densidade que ele
precisa, não com o preconceito atual ou com o medo que permeia o Governo
nesse assunto.
O que você achou da medida do CNJ que normalizou a união igualitária nos cartórios?
Achei importante e necessária. Ela mostra que os avanços têm de vir
de algum lugar. Por outro lado, mostra como essa pauta, especificamente,
tem mais facilidade de compreensão no âmbito do Poder Judiciário, que
no Legislativo e Executivo. Só fico triste quando alguns avanços da
cidadania têm de vir por um poder que não seja o político. Mostra que a
política brasileira ainda tem problemas em entender o que é cidadania e
igualdade de direitos.
Os jovens estão perto ou longe dos partidos políticos?
Não dá pra falar nessa abstração. Alguns partidos são os preferidos
pela juventude brasileira, por conta da afinidade programática e
ideológica. Outros são partidos velhos, de ideias e de pessoas. Alguns
têm garantido mecanismos de renovação geracional, o que empodera o jovem
na estrutura partidária, fortalece os espaços de organização juvenil no
interior do partido também. Mas como melhorar esse cenário? Com uma
reforma política que estimule a participação do jovem e do povo
brasileiro, que permita que o Executivo e o Legislativo estejam mais
próximos de representar a diversidade que nos caracteriza como nação.
Pessoalmente posso dizer que o meu partido não é um coração partido.
Tenho lado.
Em relação ao governo federal, como você avalia as políticas para juventude?
Estamos entrando hoje em um novo ciclo de políticas públicas de
juventude, com a consolidação dos espaços de controle social e gestão no
Governo Federal, respectivamente o Conselho Nacional de Juventude e a
Secretaria Nacional de Juventude. Com a aprovação do Estatuto da
Juventude e a sanção posterior da presidenta Dilma, teremos no horizonte
a possibilidade de construir um Sistema Nacional de Juventude que
consolide essa como política de Estado, com estruturas,
responsabilidades de todos os entes federados, orçamento. As políticas
que tem sido tocada têm se mostrado importantes. Hoje temos o Juventude
Viva, de enfrentamento à mortalidade da juventude negra, um programa bem
estruturado, planejado e articulado, que precisa de mais envolvimento
dos Estados e municípios. A atualização da Política Nacional de
Juventude e Meio Ambiente, a criação de equipamentos de referência
territoriais, as Estações da Juventude. Por outro lado, programas
essenciais como o Projovem Urbano e Trabalhador tem sofrido
dificuldades. Os Pontos de Cultura estão abandonados e a Aids tem
avançado sobre a juventude sem qualquer resposta eficiente e corajosa do
Governo. Mas no geral, podemos tranquilamente dizer que nos últimos dez
anos o Governo Federal deixou de entender essa como uma pauta marginal.
A prova disso é que ela só passou a ser tratada como política pública
justamente nesse período.
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