S. Paulo – A primeira Festa Literária no Brasil que
nasce com o compromisso de romper com a invisibilidade a que estão
relegados os autores e escritores negros, sem espaço nas cerca de 250
Festas Literárias realizadas no país, como a Festa Literária (FLIP), realizada anualmente em Parati, Rio. Essa é a proposta da FLINK-SAMPA – Festa de Conhecimento, Literatura e Cultura,
que a Afrobras e a Universidade Zumbi dos Palmares realizam de 15 a 17
do mês que vem no Memorial da América Latina, em S. Paulo.
Na coletiva de imprensa para apresentar a Festa, que aconteceu nesta
terça-feira (08/10) no auditório Mário de Andrade, do Memorial, os
organizadores destacaram que a proposta é mostrar o protagonismo negro
nas artes e na cultura no Brasil.
O escritores Paulo Lins, autor de “Cidade de Deus” e único autor
brasileiro negro na Feira de Frankfurt, na Alemanha, já confirmou
presença, a exemplo do compositor e escritor Nei Lopes, de Joel Rufino
dos Santos, e de Ana Maria Gonçalves, autora do livro “Um defeito da
Cor”, que virá dos EUA, onde mora atualmente. De Moçambique virá a
escritora Paulina Chiziane.
Sair do sonho
“É uma ação de integração e inclusão, que coloca a temática no negro na
pauta e diante das oportunidades para criar um Brasil melhor e mais
justo. Essa diversidade deve ser discutida, mostrada, debatida para que
possamos integrar todos os brasileiros num círculo virtuoso da produção
artística, intelectual, étnica e cultural. Moldar um Brasil que sai do
sonho para se tornar realidade”, explicou Ruth Lopes, diretora da
Afrobras.
Além de artistas, escritores e grupos de teatro de cinco nações
africanas de língua portuguesa (Angola, Moçambique, Guiné Bissau, São
Tomé e Príncipe e Cabo Verde), já estão confirmadas as presenças do ator
norte americano Danny Glover e do pastor Jesse Jackson, que está entre
os nomes de maior expressão do movimento negro norte-americano nas
décadas de 60 e 70, juntamente com com Malcom X e Martin Luther King.
A Festa tem orçamento estimado em R$ 2,5 milhões que deverá ser coberto
por patrocinadores. Empresas como a Coca-Cola e a Petrobrás, bancos
como o Bradesco, o BNDES, entre outros, e Governo Federal, além do apoio
da Fundação Memorial da América Latina e do SESC, entre outras
instituições nacionais e norte-americanas. “Envolver os patrocinadores e
fazer com que coloquem dinheiro não é fácil. Mas, hoje já se pode dizer
que os potenciais patrocinadores veem a questão como business, como negócio. Temos certeza que vamos conseguir os apoios necessários”, acrescentou.
Negro na pauta
Na abertura da coletiva, Nilton Silva, da Afrobrás, disse que a idéia
da Festa Literária, que terá o poeta Cruz e Souza como patrono, foi
motivada pela conclusão a que chegou seu idealizador, o reitor José
Vicente, de que o Troféu Raça Negra, que este ano entra na sua 11ª
edição, já cumpriu o papel de “colocar o negro na pauta do Brasil”.
“Passados 11 anos, com o país tendo 250 Festas e Feiras Literárias, e após a FLIP,
pouco se vê da presença negra. Não há visibilidade negra nas Festas
Literárias. Há uma nova classe média negra completamente consolidada no
país. É preciso fortalecer as políticas afirmativas e incrementar o
intercâmbio acadêmico e cultural”, afirmou.
Alem de Ruth, participaram da mesa, o crítico literário e maior
especialista em Cruz e Souza no Brasil, Uelington Farias Alves,
Fabrizzio Topper, do Projeto Bicicletando, e a
professora Sônia Guimarães, conselheira da Afrobras que anunciou as
atividades acadêmicas e institucionais que terão a participação das
Universidades Historicamente Negras dos Estados Unidos (HBCU) e
Universidades brasileiras como a UNIFESP, UNESP, UNICAMP e USP, entre
outras.
Topper, criador do Bicicletando, falou do passeio
ciclístico que acontecerá no domingo, 17 de novembro, entre o MASP, na
Avenida Paulista, e o Memorial. "Existem 80 milhões de bicicletas no
Brasil e 50% dos que usam a bicicleta o fazem como solução do
transporte. Queremos incluir a discussão da mobilidade urbana", afirmou.
À noite haverá a entrega do Troféu Raça Negra, o “Oscar” da comunidade
negra brasileira, com homenagem póstuma ao cantor Emílio Santiago, morto
este ano.
O negro e a literatura
Uelington destacou que a presença negra na literatura não tem encontrado espaço nas Festas Literárias – como a FLIP.
Lembrou o exemplo de Cruz e Sousa, “um homem nascido na escravidão que
se tornou o maior expoente de uma escola literária criada por ele no
Brasil, o simbolismo". “A literatura negra no século XIX nasceu com os
escritores negros. Foi Paula Brito, que lançou no mundo da editoração,
Machado de Assis, o maior nome da literatura brasileira e um dos maiores
escritores da literatura mundial. Que escritor negro é esse que é
importante, mas não tem visibilidade?", pergunta.
Segundo Uelington há um mercado consumidor de literatura negra como
também há possibilidades de crescimento editorial. Ele define a
literatura negra não apenas a feita por negros. "Literatura negra pode
ser feita também por escritores não negros. A proposta da FLINK é
ter o negro descrito pelo negro, dentro do contexto autoral e
literário, como protagonista do seu destino, narrador de suas alegrias e
dores. Muitos escritores negros querem participar, assim como cantores e
atores. O evento, que tem como base a bem sucedida FLIP, vai ser um portal de promoção e exposição de autores negros e da temática afrodescendente”, explicou.
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